O Castel Sant’Angelo, ao longo da história de Roma, já desempenhou muitos papéis: mausoléu, castelo, fortaleza, aposentos papais, prisão, museu etc. De todos estes atributos, vejo-o principalmente como uma fortaleza. O lugar é robusto! Talvez, exatamente por ser uma fortaleza, esta construção atravessou tantos séculos sem sofrer as tão comuns depredações bárbaras.
Geralmente, como há muito o que se ver em Roma, esta incrível construção costuma ser negligenciada para o segundo plano. Comigo não foi diferente. Só resolvi usar uma das minhas duas entradas do Roma Pass 72 para entrar no castelo na minha segunda viagem a Roma. Eu tinha poucas expectativas, e isso fez com que minha visita se tornasse algo memorável, que agora compartilho com vocês.
O visitante precisa saber que a visita começa antes, mais precisamente na ponte San’t Angelo, que fica de frente à entrada do Castelo. Esta é uma das mais belas pontes de Roma. Grosso modo, ela marca a travessia da Cidade profana para a cidade sagrada, isto é, da urbe romana para o Vaticano, localizado à esquerda do Castelo.
Ao atravessar a ponte Sant’Angelo, com 10 estátuas angelicais revivendo a paixão de Cristo, a imagem que se tem é de um edifício redondo, imponente e pesado. Olhando de frente sempre tenho uma estranha sensação de que estou vendo a proa de um enorme navio. Será? Mas vá lá, isso são coisas da minha cabeça.
Acaso você, caro leitor, consegue ver algo de diferente neste edifício?
A fortaleza-castelo é um edifício cilíndrico assentado sobre uma base quadrangular, cercado pelo parque Adriano. Ao adentrá-lo, acho que poucos lugares me passaram melhor a sensação de ‘passado’ do que as paredes deste castelo, manchadas em alguns pontos por um preto-carvão, onde fiquei a imaginar se aquilo se devia a ação de labaredas de tochas gravadas muitos séculos atrás. Sim, imagine se você puder.
Talvez, o que fez eu achar este lugar tão brutalmente belo tenha sido o fato de que minha visita se deu nas proximidades do pôr do sol. A cor amarelo-âmbar incidindo sobre os blocos de travertino criou um ambiente vivo e cheio de possibilidades fotográficas. Explorei-as satisfatoriamente em diferentes recortes de sombras, cliques de detalhes que somem na grandeza desta construção.
Como entre os Séculos X e XIV este era o único edifício fortificado de Roma, segundo o que li em “Roma – Arte e arquitectura“, ter a posse deste lugar representava deter o território mais seguro da região, razão pela qual as principais famílias lutavam para se apoderar de seu espaço, pois isso era o mesmo que reinar sobre a cidade. Era a lei do mais forte, mas também era a herança da política de Roma e seus conchavos. Famílias renascentistas travando guerras entre si e uma construção que, inicialmente idealizada para ser túmulo, ora se revestia de um abrigo para proteger vidas. Ironias da história.
Caminhemos.
Advertência: é preciso ter disposição para subir rampas e escadas. Pense num caracol. Sim, para chegar ao topo você seguirá por esta serpentina de blocos maciços que ressaltam a personalidade prisioneira deste edifício. Mas não tenha medo, as invasões bárbaras já não acontecem com tanta freqüência e os pretorianos caíram em desuso. rs…
Também é verdade que minha visita ao Castelo não se deu de forma abrangente, visto que acabei não entrando em muitas alas ou espaços. Eu não estava realmente preocupado em conhecer tudo. Perdoem-me o exagero de um típico sagitariano, sou da opinião de que em Roma nunca se conhece algo completamente. Assim, interessava-me, desde o início, apenas a construção em si, bruta e sem apetrechos para se auto-justificar como um museu. Cá entre nós, acho uma extravagância chamar este lugar de museu. Por que não simplesmente Fortaleza ou Castelo? Roma já tem museus demais, e a maioria dos mortais não dá conta de os visitar a contento.
Depois de muitas escadinhas, rampas, passagens e corredores, chegamos ao Café localizado numa das laterais superiores do Castelo. É por demais inusitado beber um ristretto dentro de um lugar tão “atravessado” de história. Achamos por sorte uma mesa lateral, com vista deslumbrante para a cúpula da Basílica de São Pedro. Uma moça veio, não tão simpática como me acostumei a imaginar as italianas, fizemos o pedido e pagamos de imediato.
Tomar um café num castelo milenar não é algo em si barato, mas é o preço que se paga pela experiência da contemplação de ver Roma lá embaixo, e o pôr do sol emoldurado pela cúpula da Basílica de São Pedro.
Após o café, seguimos em direção ao terraço superior, do qual temos uma vista de 360° de Roma. Contorcionismos à parte, aqui todos procuram um ângulo inusitado para tirar aquela self. Nada contra, todos estão sorrindo e o pôr do sol é um presente ao fim do dia. Eu fiquei pensando em como é importante preservar a história, para que haja um futuro rico de significados e símbolos. Roma é bela por isso, tudo aqui desperta os sentidos. Estamos sempre, de alguma forma, dialogando com os antepassados.
A visita ao Castel Sant’Angelo foi melhor do que eu imaginava. Talvez por não seguir um roteiro cheio de descrições enfadonhas e com datas que pouco tem um significado real para mim. Eu havia feito o dever de casa e pesquisado bem sobre este lugar. Estando lá, busquei tirar minhas próprias impressões, fossem elas estritamente corretas ou não. Muitos visitam o Castelo pela vista 360° que ele proporciona. Isso é deveras um ponto positivo. Porém, minha visita a este castelo teve um caráter mais intimista. Espero ter conseguido transmitir esta experiência. Até a próxima.
Todos os caminhos levam ao:
Castelo Sant’Angelo
Onde: Lungotevere Castello, 50 – Roma
Quando: Aberto todos os dias, das 9:00 às 19:30.
Quanto: Usei uma das entradas principais do Roma Pass para conhecer o Castelo.
Livro consultado: Roma – Arte e Arquitectura, de Brigitte Hintzen-Bohlen, com a colaboração de Jürgen Sorges. Edição portuguesa 2006.